
As universidades portuguesas estão no inicio do ano académico. A UAL não foge à regra. A universidade mudou nos últimos anos o ar taciturno e mole da cidade de Faro. Deu-lhe vida, sobretudo nocturna. A cidade rejuvenesceu com os estudantes vindos de todo o país e tornou-se uma cidade universitária que já tem alguma reputação a nível nacional. Hoje reparei como há muitas caras novas, ainda com vestígios de acne no rosto, ar de quem acabou de chegar das vilas e aldeias do interior, outros com ar urbano e afoito de quem já sabe mais da vida do que devia.
São jovens que acabaram de assumir a responsabilidade de dar um rumo às suas vidas longe das saias da mãe, longe dos lugares onde brincaram e das escolas onde aprenderam o suficiente para quererem vir a ser «doutores».
Chegam entusiasmados com a sua nova vida e o que se lhes depara? As praxes da semana académica, para começar! Um ritual de integração na vida académica que faria todo o sentido não estivesse esse processo de boas vindas cheio práticas pouco edificantes.
As praxes académicas transformaram-se em Portugal num rol, mal amanhado, de actos de submissão, humilhação e acomodação dos caloiros recém-chegados ao sistema académico montado ao longo dos últimos anos. A academia, vista á luz destas práticas, acaba por ser um espelho da nossa sociedade. Quem está dentro do sistema tudo faz para que quem chega não ponha o em causa nem belisque hierarquia estabelecida. Para tal o processo de recepção aos novatos inclui práticas humilhantes, voluntariamente aceites que acabam por definir o estatuto de cada um no xadrez da academia. Isto não seria grave se não fosse um espelho daquilo que é a sociedade portuguesa. Quem está instalado no sistema tudo faz para que quem chega aceite as suas regras, se torne compadre dos seus interesses e integre a hierarquia sem a pôr em causa. As corporações trabalham para que os seus interesses se perpetuem, para que o sistema não abane nos seus alicerces devido a actos impensados de jovens rebeldes, cheios de loucas ideias inovadoras e perturbadoras para quem está montado no sistema. Tudo é preparado para a evolução na continuidade, sem rupturas nem sobressaltos.
Um grupo de caloiros caminhava pelo Fórum Algarve em fila indiana, ligados uns aos outros agarrando a orelha direita da «besta» que o precedia ( digo besta porque era assim que estavam identificados por um letreiro que tinham pendurado ao pescoço dizendo: «Grande Besta de Economia». Caras sujas de tinta, respostas obedientes, risos imediatos, auto-punição verbal na ponta da língua. Eram liderados e obrigados nos seus actos por alguns elementos com ar de quem sei-posso-e-mando, colegas que já passaram em anos anteriores pela mesma experiência de integração.
Não fui estudante universitário, com muita pena minha, mas percebo bem porquê a minha irmã se recusou a alinhar neste espectáculo, quantas vezes deprimente, que são as praxes académicas.
O que podia ser uma semana bem imaginada, divertida e sempre renovada é ano após ano a repetição de bestialidades deprimentes que em nada dignifica a vida académica e os futuros doutores e engenheiros deste país.