terça-feira, maio 13, 2008

A HOMOFOBIA DOS PORTUGUESES


Trouxe no outro dia a este espaço uma referência rápida ao maior estudo feito até agora sobre a sexualidade dos portugueses. Precipitei a minha atenção sobre a manta homofóbica que segundo o estudo parece cobrir a esmagadora maioria da população portuguesa. Quando vi os números, confesso que fiquei surpreso, ou melhor: desiludido. Claro que sei que a sociedade portuguesa é conservadora e tradicional e em termos de sexualidade das menos ousadas do Velho Continente. Recebi a cifra como um retrocesso. A expressividade dos números não deixavam margem para dúvidas: 70% dos portugueses consideram as relações homossexuais erradas. É grave. Choca. Imaginar que tantos portugueses reduzam o amor homossexual a uma moralidade e religiosidade de pacotilha, onde os sentimentos das pessoas valem menos que os preconceitos: é duro. Este estudo lido assim: de forma fria e distante mostra bem quanto o nosso povo é ignorante e incapaz de perceber que o amor não faz escolhas: ama simplesmente: branco, negro, bonito, feio, velho, novo, alto, magro, gordo, careca, homem ou mulher. Enquanto o Homem não perceber isto, não aproveitará grande coisa da Vida, e jogará na sargeta o melhor da sua.



Estes números demonstram como estamos a anos-luz da aceitação dos casamentos homossexuais ou da adopção de crianças. Refiro-me apenas às consequências imediatas deste estudo. Que governo se atreverá a levar o tema da legalização dos casamentos, entre duas pessoas do mesmo sexo, para aprovação, depois de 7 em 10 portugueses considerarem tal relacionamento errado?

O estudo lançou os números, mas eu recuso-me a considerá-los definitivos. Não é esta a percepção que tenho do país onde vivo. E não estou só. Alguns leitores deste blogue assumiram a mesma dúvida, comentando de viva voz o referido estudo.



Depois pensei: será que estou errado e o país reprova de forma tão avassaladora o amor entre dois homens ou entre duas mulheres? Se assim é, então, o Algarve é diferente do resto. Estou convencido que com excepção da área metropolitana de Lisboa, o Algarve é a região do país mais desperta para as novas formas de pensar as relações entre as pessoas. Anos e anos de contacto com gente vinda de todos os cantos, com a descontracção de quem está de férias e calentando os sentidos ao sol, despertaram os algarvios para as cores do arco-iris que representam a diversidade da vida das gentes.





Embora não pareça sou um optimista nato. Acredito, sem razão para tal, que as coisas vão correr bem. Nunca tive artes para brincar de faz de conta com a minha orientação sexual. Nunca soube fingir-me conquistador de corações de donzelas indefesas e ingénuas. Mas sempre seria mais fácil, representar tal farsa, que enfeitar-me de bicha louca e sair por aí esvoaçando, qual ave do paraíso, de plumas ao vento. Nem uma coisa nem outra: nem saltos de agulha, nem bicha de gaveta ,com mulher e filhos trancados em casa, calcorreando o descampado do «pátio das osgas» em noites de lua cheia.
Com excepção de certa vez em que não me contive e sequei um belo rapaz com os olhos, sem me aperceber do espectáculo que estava a dar, até que ele pôs termo ao galanço, da pior maneira, para mim, não tenho recordações de ter sido vítima de comportamento abertamente homofóbico. Com o passar dos anos e quanto mais se torna pública a minha orientação sexual e a minha relação com o Shwasy, mais tenho a sensação de que a mentalidade das gentes desta região tem vindo a mudar de forma sensível. Não quer isto significar que o comentário maldoso e cínico não se faça sentir. Não quer dizer que não haja quem aproveite para ter motivo de conversa e faça manta de retalhos com o que imagina, o que sabe e o que pretende saber. Não quer significar que lá no fundo, no fundo, muitos não reprovem. A diferença é que começa a faltar a onda de fundo, o apoio generalizado que permita a esses revelar a sua homofobia. Já não se sentem com as costas quentes para poderem exteriorizar o seu ódio sem consequências. E esta mudança é fundamental: o pensamento homofóbico já não é maioritário por isso, começa a tornar-se, cada vez, menos visível. Este é o meu sentimento quanto ao que se passa no Algarve. Talvez esteja a ser optimista, para variar.
Tenho a sensação que o caminho tem vindo a ser percorrido, talvez mais lentamente do que desejávamos, mas só os mais pessimistas podem defender, a pés juntos, que o Portugal de hoje não se moveu nem um milímetro em direcção a uma mentalidade mais aberta. A caminhada não foi tão grande como noutros países, bem próximos, mas os números que este estudo apresenta têm que ter então uma justificação.
Estou seguro que os 70% de pretensos homofóbicos do estudo não são a fotografia da nossa sociedade.

Para não me alongar mais deixo AQUI uma possível explicação para tanta reprovação dos comportamentos homossexuais que este estudo parece levar a crer. Se a pergunta tivesse sido formulada noutros termos os resultados seriam semelhantes? Quem elaborou o estudo pode não ter sido tão imparcial nem inocente na forma como o fez.

3 comentários:

Anónimo disse...

Este estudo não é sério...basta analizar o tipo de perguntas!!!
Recuso em aceitar estes resultados como verdadeiros, pois a minha persepção da realidade é outra bem diferente.
Contudo a visibilidade dada pelo jornal a tais resultados, só bem alimentar a homofobia existente e de algum modo ampliá-la.
Mas como também sou um optimista, isto um dia vai mudar...só que para muitos já vai ser tarde.
Só lamento que seja o jornal Público a dar tal destaque.

Anónimo disse...

Este estudo,só mostra a sociedade hipócrita (basta analisar o modo como a pergunta é formulada)em que vivemos... Quantos terão respondido a este inquérito com um "totalmente errado" e depois, dizendo à sua "Maria" (que como boa esposa fica em casa com as crianças) que vão beber um copo, é encontra-los nos bares gay à procura de um engate de uma noite! A homossexualidade, o aborto, a despenalização das drogas leves, o divórcio,a sexualidade,o racismo, a igualdade entre homens e mulheres(e não estou a falar apenas de direitos) são assuntos que ainda fazem corar muito "boa" gente, gente dona da verdade e de boas intenções... e como nós todos sabemos... "de boas intenções está o inferno cheio".

Anónimo disse...

Também me parece que o nosso Algarve é algo diferente do resto do país. Mas confesso que não raras vezes me assola a dúvida de eventualmente viver numa bolha...

Bom post!