segunda-feira, abril 21, 2008

O MEU AGRADÁVEL LUGAR DE «DESTINO»



Se a crença no destino fizesse parte da minha forma de encarar a vida diria que, o sítio dos Alporchinhos, estava escrito nas estrelas no dia em que nasci. Nasci e vivi até tarde no sotavento algarvio, no concelho de Olhão, como sabem. Não tinha gente, nem nada que me ligasse àquela região, mas volta não volta é ali, ao lado da capela da Senhora da Rocha, que vou parar. Uma parente distante que habita na vila de Armação de Pêra foi a razão da primeira visita. Foi assim que fiquei, certo dia de verão da minha adolescência, a conhecer a Praia Grande, entre a dos Pescadores e a dos Salgados, que anos mais tarde conheceria na intimidade.

Nada mais me ligava àquele lugar até que abandonei a nobre missão de vir a encaminhar almas para o Céu e me dediquei a uma bem mais mundana: saciar a sede dos pecadores com cubos de gelo mergulhados em whisky de malte. Seduzido pelo ar gingão de um Tom Cruise, malabarista de garrafas de rum, decidi que queria ser como ele e enveredei pela vida de barman. E podem ter a certeza que nem me saí mal de todo. De tal forma que fui estagiar para o único cinco estrelas que recrutava estagiários de bar naqueles tempos. Adivinhem onde se situava tal estabelecimento hoteleiro? Exactamente: no sítio dos Alporchinhos, junto a Armação de Pêra!

Por essa altura, o meu «celibato» já era passado. Fomos, eu o meu primeiro namorado, conhecer a terra para onde iria trabalhar todo o verão de 86. Eu não me atreveria a tanto, mas o meu amigo não resistiu e fez-me entrar na igreja da vila. Sentados na primeira fila, mesmo frente ao altar, nas barbas, não sei de que santo, quem sabe da virgem ou mesmo do próprio Cristo (Já não recordo) trocamos um longo, profundo e irreverente beijo. Recordo que os meus olhos adquiriram as capacidades dos do camaleão, tal o meu receio de que alguém nos surpreendesse naquele acto impróprio para santos.

Fiz então o estágio de bar no Hotel Viking, agora do grupo Pestana. Construído sobranceiro à falésia da praia era na época uma construção quase solitária na paisagem semi-virgem, logo ali a uma escadaria enorme de distância da praia resguardada pelo promontório rochoso da capela, a ocidente e o que servia de suporte à piscina do hotel, a leste.

Nos dias livres percorri, durante horas esquecidas, as falésias altaneiras a dezenas de pequenas praias escondidas, algumas inacessíveis por terra, resguardadas dos ventos e rendilhadas de grutas esculpidas pela força do mar. Pequenas maravilhas da natureza que ainda hoje fazem as delícias dos turistas que procuram a natureza em estado bravio na busca de experiências únicas que a vida urbana lhes rouba, no resto do ano.
Findos esses meses de estágio, que terminaram com uma semana de trabalho intenso e uma directa para rematar a azáfama da realização do Rally do Algarve que assentava as rodas naquela casa, mudei-me de armas e bagagens rumo a outros destinos.

Não voltei à vila durante anos. Uma noite passada com o klaus, o tal namorado alemão que vos falei alguns posts atrás, foi toda a ligação que tive à terra até que o destino me empurrou de novo para lá em 1997.

Abandonada a aventura adolescente de servir copos a vida profissional conduziu-me de novo, não ao hotel Viking, mas a uma loja que dele distava dois minutos de caminhada em passo largo. Dois anos a matar saudades da beleza daquele lugar, de novo regressei ao Sotavento. Talvez tenha imaginado que assim finalizava a minha presença por ali, mas valores mais altos se levantaram e pouco anos depois estava de volta ao mesmo lugar.

Hoje aproveitei a hora de almoço para me debruçar mais uma vez sobre o muro de branco caiado que circunda a capela e permite uma vista fabulosa sobre a ternurenta e acolhedora praia.
Apesar do dia semi-invernoso lá abaixo contei oito casais e famílias aproveitando o sol quando este se dignava a espreitar entre as nuvens. As altas falésias laterais protegiam-nos do vento e era o quanto baste para ali desfrutarem do sol esquivo deste Abril: o mesmo que não dá as caras nas suas cidades até bem mais tarde. Outros menos afoites ficavam-se pela esplanada frente a um prato de peixe soberbamente confeccionado, certamente. Olhando no sentido oposto, nos carreiros rodeados de arbustos e plantas endémicas, os tais apreciadores do turismo da natureza partem para mais uma expedição à descoberta dos pequenos segredos que se escondem entre as rochas, nas grutas e nos alcantilados que acabam em recantos de areias brancas acariciados pela espuma das ondas que, quando não encontram o areal, se desfazem contra as rochas escavadas pelo mar ao longo de milénios, muito antes de Deus ter decidido criar o Homem.


Diariamente percorro mais de 70 quilómetros para ir trabalhar naquele lugar que de tanto ter perto se tornou banal. Quantos de vós não gostariam de trabalhar num lugar com uma beleza natural assim? Junto a um lençol de areia iluminado por um sol generoso e envolto numa paisagem natural quase em estado bruto, surpreendentemente! Eu confesso que passo meses sem lhe prestar atenção. Não sei por quanto tempo lá estarei. Muito menos imagino se alguma força do destino que recuso e de que desconfio me fará lá voltar mais tarde na minha vida.

Uma coisa eu sei: quem escolhe este local para passar férias e o sabe explorar e descobrir não dá por desconcertante a sua escolha e não mais se esquecerá dele.





3 comentários:

Anónimo disse...

Este país tem pequenas jóias, espalhadas um pouco por todo o território, quantas vezes escondidas, da maioria das pessoas, para bem das ditas,jóias naturalmente...
É deste Algarve, branco, bonito,limpo de mamarrachos, que eu gosto, e que devemos a todo o custo preservar.
Este é um lugar que eu não conheço, mas que irei concerteza conhecer.
É mesmo, muito bonito!!!

João Baptista disse...

estive neste local no meu aniversário

Anónimo disse...

Olá!
Tenho de ir rapidamente a esse lugar paradisíaco. Em que concelho fica? Portimão? Lagoa? Como é que se chega lá?
Que sorte poder trabalhar num local magnífico como esse!
Parabéns pelo texto e obrigado por partilhares pormenores tão interessantes das tuas vivências e das tuas experiências passadas connosco (os teus fãs).
Como sempre os teus textos são excelentes! Mas eu já disse isso noutros comentários e já conheces a minha opinião a tal respeito.
Um abraço do
João Paulo