domingo, março 30, 2008

BOM CRIOULO - PROPOSTA DE LEITURA

"Foi preciso esperar 112 anos para ver editado em Portugal o romance que fez de Adolfo Caminha (1867-1897) o fundador do homoerotismo brasileiro em literatura."Eduardo Pitta, numa resenha, sobre o lançamento (só agora?) do romance Bom Crioulo em terras de Camões e Fernando Pessoa.
Como se sabe - ou se deveria saber -, o livro, de 1895, conta os amores homossexuais entre Aleixo, um grumete louro, e o marinheiro negro Amaro (o "Bom Crioulo" do título). Homossexualismo e questões raciais? Demais para a época.

Segundo consta, Bom Crioulo é o primeiro romance homossexual em toda a literatura.

ou leia um resumo: aqui

VOTEM EM MIM!

E eu se chegar a Primeiro Ministro prometo baixar os impostos tanto, tanto que ninguém vai dar por eles.





SERÁ QUE FOI MESMO ENGANO?

«Cada um de nós deve dar o melhor de si para um país mais justo, para um país mais pobre.»
José Socrates, Primeiro ministro de Portugal

The world needs a tape like this.
Agência: Heads Propaganda, Curitiba, Brazil
Director criativo: Kike Borell
Director artístico: Paulo de Almeida
Copywriters: Gustavo Frare, Isis Ribeiro
Fotografo: Nuno Papp

sábado, março 29, 2008



BLOGPEDROALMODOVAR


Pedro Almodôvar está a trabalhar afincadamente no guião do seu próximo filme: «Los abrazos rotos». Diz ele que «acabou em Outubro o primeiro rascunho do guião e já vai na sexta versão». Esta é a primeira confissão, do genial realizador espanhol, com que nos deparamos no blogue que criou para compartilhar connosco pensamentos, reacções, sentimentos e maneiras de ver a propósito do filme em que está a trabalhar. Três secções: guião, fotos e vídeos, introduzem os futuros espectadores de «Los abrazos rotos» na pré-produção e ensaios do filme. Ficamos a saber que o guião do próximo filme é «o que tem mais trama de todos os que escrevi». Confidencia aos fãs que «necessita da ficção quase tanto como de oxigénio».

Com o seu tempo ocupado na escrita definitiva do guião e depois na realização do filme vai actualizar o blogue nos tempo livres, «pelo menos até terminar a rodagem», do que se espera vir a ser mais um sucesso de bilheteira do realizador do país vizinho.



Para os interessados e curiosos entre em BlogPedroAlmodovar .

COM PAIXÃO






sexta-feira, março 28, 2008

quinta-feira, março 27, 2008

A BONECA NÚBIA (II)






(Continuação)




Visitamos a aldeia das ruas pavimentadas pela areia do deserto e das casas fustigadas pelo vento. Os ocres poderosos nas fachadas ampliados pela luz do sol quase a ferirem os olhos. Os pátios interiores abertos, amplos, luminosos, cobertos de uma fina capa de areia. O mobiliário rudimentar quase inexistente em divisões iluminadas por uma nesga de luz que chegava através de janelins semi-cerrados. As crianças sorrindo. E uma mulher de pele quase negra, fustigada pelo vento e escurecida, em dobro, pelo sol: magoada. Viúva e digna como as nossas avós alentejanas enlutadas, recebeu-nos em sua casa. O pão para si e para os filhos ganhava-o a cada dia abrindo as portas do seu lar a estranhos, vindos de longe que comentavam a sua privacidade com palavras que não entendia. Escancarava a sua humilde existência enquanto oferecia um chá de menta a turistas que tudo vasculhavam sem pudor. Com uma curiosidade turística espreitamos todos os recantos, sem levar em conta o olhar triste daquela mulher que se via obrigada a abrir as portas de sua casa a desconhecidos. No final da visita fomos, como era esperado, convidados a contribuir com o que desejássemos para ajudar aquela família a suprir as suas necessidades. Só as mais elementares porque ali não havia vestígios dos pequenos luxos sem os quais nós já não sabemos viver.




Depois do esplendor dos templos, dos monumentos, dos túmulos dos faraós, dos mercados, do deserto, aquele foi o momento de ver as pessoas de perto. Apesar da incomodidade que é aceitar ter a sua casa vasculhada por estranhos, tenho de agradecer àquela mulher ter-nos aberto as portas da sua humilde existência. Não era miséria nem pobreza: era simplicidade digna, limpa, corajosa que marcava do seu lugar no mundo.


Nós somos mimados de mais para perceber o que é viver com o mínimo e continuar a querer viver. Apesar de ser perceptível por todo o país, só quando a vimos de perto nos sentimos tocados pela falta de recursos com que grande parte da população do planeta vive. Como seria habitar aquele lar? Como conseguiríamos viver assim? Tão limitados de conforto, tão privados do essencial, tão desertos dos luxos mínimos. E há quem viva, pelo mundo fora muito pior: a anos luz do rudimentar conforto daquela casa. Em boa verdade o único luxo visível naquele lar era o sorriso das crianças.

Com os pés aquecidos pela areia que escorregava, pelas ruas em declive, chegamos ao cais onde o barqueiro tinha amarrado a nossa faluca, idêntica a todas as outras que, em silêncio, navegavam sobre as águas empurradas por um vento morno vindo dos lados da Líbia. Fazia por gravar aquela paisagem, tão poderosa quanto simples, na minha memória. O Egipto é um país gordo de história, de paisagens e de gente como poucos. A visita tinha redundado numa lição de vida.

A enorme duna de areia atrás da aldeia já tinha raptado o sol até à manhã seguinte. O último passeio junto ao Nilo chegava ao fim. Estava na a hora de regressar à faluca quando ao longe comecei a escutar uma voz de criança que gritava: Laurentius, Laurentius! Percebi que era por mim que chamava. Olhei ao longe e lá vinha, correndo na minha direcção, o pequeno egípcio descalço com a boneca de madeira pintada, fechada na mão, erguida em frente ao rosto gritando: Laurentius! - Tu as promis!

Claro que eu tinha prometido comprar-lhe a boneca de vestido azul às flores com enormes argolas pendendo das orelhas e um pote de água à cabeça. perante a sua insistência não ia faltar à minha palavra. Não estava seguro que ele estaria lá no fim do dia. Quando lhe prometi comprar a boneca não me importava se lá não estivesse. Mais uma recordação para encher a mala de viagem já cheia de obeliscos de 5 quilos! Mas para ele não era indiferente estar ou não ali. Para mim deixou de ser depois de saber como fazia diferença comprar ou não aquela boneca . Cheguei a pensar que podia poupar uma libras se ele não estivesse. Mas não ele não se podia dar ao luxo de não comparecer. As poucas libras que ia receber faziam toda a diferença no orçamento familiar.

A boneca núbia está, agora, aqui ao lado a observar o que acabei de escrever e o eco da voz do jovem núbio continua a ecoar na minha mente sempre que olho para ela e vejo os olhos vivos daquela criança cobrando a promessa que eu cheguei a pensar que podia não cumprir: - Laurentius, tu as promis!

MAKE LOVE NOT ZONE!









A BONECA NÚBIA


O nosso arquivo central, embora não tenhamos consciência disso, guarda todos os momentos que dão corpo à nossa experiência de vida. A maturidade que ostentamos é fruto do que aprendemos de tudo o que aprontamos, que vimos ou sofremos, numa palavra: experimentamos. Uma pequena percentagem do que guardamos na mente foi de tal maneira marcante que de tempos a tempo abrimos a gaveta e revivemos a delicia ou o horror por nós vivido. Porque só a recordação dos bons momentos potencia o prazer de viver é a eles que recorremos quando queremos acreditar que a felicidade existe. Não fosse o passado estar sempre presente, o presente, só por si, seria demasiado efémero para preencher as nossas vidas e a crença no futuro demasiado incerto para as alimentar. É o vivido que nos dá consistência e estabilidade. A ele recorremos como prova de que a vida vale a pena. Os outros, os maus momentos, estão lá também e vale sempre a pena lembrá-los, para que não se repitam.

As minhas férias de sonho estavam a acontecer. A subida do Nilo chegara ao fim. O barco-hotel estava ancorado no porto de Assuão. Ao longe o paredão enorme da barragem do maior rio africano parecia uma miragem. A descoberta da cidade, já noite escura, tinha sido um momento único no dia anterior. Um Karkadé a fumegar e o odor a morango inalado de uma shisha azul ardósia suave, fora um momento único de convívio e de ligação à cultura árabe (experiências de turistas!). Os velhotes árabes, peritos no uso do arguile , conversavam animadamente à nossa volta. O grupo de portugueses maravilhado pelo ambiente sentia que aquele era um mundo a que não pertenciam, mas onde se sentiam bem e estavam dispostos conhecer tão de perto quanto possível.


Ao pensar em trazer comigo algo palpável desse mundo desejava possuir a réplica de um obelisco. No comércio local, sem grande arte, confesso, regateei o preço tanto quanto pude. Quando os valores se encontraram tirei as libras do bolso e dei ao homem que me pareceu feliz com o negócio. Pouco depois o nosso guia confirmou que o homem tinha feito um bom negócio. Eu tinha pago o dobro do preço que ele aceitaria receber pelo pesado obelisco. E eu estava feliz por o ter adquirido por um terço do preço inicialmente pedido. Enfim: negócios das arábias. Ficamos ambos contentes com o desfecho da disputa.
Só mais tarde me apercebi que o negócio se tinha transformado num problema de vários quilos. A peça que em minha casa recorda os dias felizes nas margens do Nilo iria transformar-se, literalmente, num pesadelo até chegar a Portugal.

O último dia previa um passeio de faluca até à outra margem do rio. Um olhar passageiro à Ilha Elefantina. Banho nas águas, não poluídas, do rio. Passeio de camelo até á aldeia núbia mais próxima. Visita à aldeia e a casa de uma família núbia . Estávamos todos fascinados com os momentos que aquelas férias nos haviam proporcionado: absolutamente inesquecíveis.
A faluca navegava suavemente rio a cima junto aos rochedos. Na outra margem, no topo de uma elevação coberta de areia o mausoléu de Agha Khan não passava despercebido. Ao chegar não resistimos a mergulhar nas águas mornas do rio, depois de alguém se certificar que por ali não moravam crocodilos.


No Egipto os vendedores de artesanato estão a cada esquina. Depois de um olhar apressado pelos objectos expostos era hora de subir dois a dois aos instáveis dorsos dos camelos pachorrentos que nos levariam junto à arriba até à aldeia mais próxima. Divertidos com as nossas figuras patetas montadas em camelos caminhando junto a um enorme declive(ainda se fossem burros!), uma boa dezena de crianças corriam e riam seguindo de perto a caravana. Gritavam, tentando convencer-nos a adquirir as pequenas peças de artesanato que vendiam. Era o seu contributo para a economia familiar.

Uma criança de pele mais escura que as outras, elegante, como todas, parcamente vestida, descalça, mas com uns olhos vivos e brilhantes enfeitados por um sorriso aberto chegou-se a mim tentando vender-me uma pequena boneca nubia. Não queria. Ou melhor, não queria ficar com as mãos ocupadas até ao fim do passeio que só estava a começar. Ele insistia. Não sei como, mas falava uma língua que eu entendia como se fosse a minha: um a mistura de francês, com espanhol, inglês e gestual: compreensível! Dizia ele que precisava que eu comprasse a boneca para ele ir à escola. Recusei, mais uma vez, mas prometi que mais tarde, no fim do passeio, compraria, imaginando que ele não estaria por perto nessa hora. Já balançava como num carrossel, ao ritmo dos passos longos e pausados do desajeitado animal, quando ele desistindo quis saber o meu nome. Sorri e revelei-lhe o meu nome de baptismo.


(Continua)

terça-feira, março 25, 2008