segunda-feira, fevereiro 18, 2008

VIAGEM AO PRINCÍPIO DA EUROPA


Nos últimos anos realizei algumas das minhas viagens de sonho. Sou fiel ao Algarve para o sol e praia. Onde vivo estendem-se, coladinhos ao mar, areais tão bons como os melhores do mundo. Para mim, destino de férias deve ser vigiado pelo sol, mas a praia é dispensável. As minhas férias procuram a história, a cultura, o urbano e o humano. Foi assim que depois do Egipto, do México, escolhemos a Grécia para as férias de 2005.
Um dos berços da civilização ocidental estava aqui a 6 horas de distância. Tinha que conhecer. Nos tempos de estudante estes lugares ganham uma aurea mítica, um fascínio romântico, uma força estruturante que se aloja no sub-consciente e integra as nossas raízes culturais de tal forma que se tornam familiares sem nunca os termos visitado.

Atenas não é uma cidade glamurosa como a Paris que me encantou recentemente. É uma cidade dura e velha plantada de pedras carregadas de passado. É ao mesmo tempo um território cheio de cicatrizes da história. Só recentemente o povo grego voltou a ser senhor do seu destino e a cuidar do seu passado. O governo está empenhado em sarar as feridas que séculos de invasões e ocupações deixaram nos legados da história que, apesar de tudo, chegaram até aos nossos dias. Os ocupantes ora ignoraram o passado ora o valorizaram a ponto de expoliarem o povo grego desses símbolos insubstituíveis da sua herança cultural. É assim que parte do friso do Partenon está no Museu Britânico em Londres, entre outras peças que foram levadas para sempre do solo grego. Para além da indiferença dos invasores pelo património edificado a natureza encarregou-se de tremer o suficiente para reduzir a escombros os magníficos edifícios da época de ouro da capital helénica reduzindo a escombros grande parte da sua monumentalidade.

Com as bagagens arrumadas no hotel, reservamos os primeiros dias à descoberta da Atenas moderna, depois chegou a hora da indispensável visita a Mikonos e só no regresso procuramos pôr os nossos olhos onde Sócrates, Platão e Aristóteles tinham posto os seus muitos séculos atrás. Depois de uma breve visita ao estádio Olímpico de Atenas não o de 2004, que deve ser igual ao de Barcelona e aos outros todos, mas àquele onde se realizaram as primeiras olimpíadas da era moderna e onde os atenienses tinham comemorado, um ano antes em grande euforia, a vitória no campeonato da Europa de futebol, passamos pelo templo de Zeus e pouco depois chegamos ao «santo dos santos» de cultura ocidental: a Acrópole ateniense .

Podem ter a certeza que senti uma emoção invulgar quando vi com os meus próprios olhos aquele lugar a transbordar de história e mil e uma vezes imaginado. Eu tinha uma imagem idealizada da Acrópole e quando me vi frente ao Propileus, enfrentando aquelas enormes colunas não pude deixar de me emocionar ao mesmo tempo que lamentei que o tempo tenha sido vil carrasco para com as pedras daquele espaço «sagrado». Senti-me amaldiçoar os otomanos que fizeram do Partenon um paiol de munições e os venezianos que o fizeram explodir, quase mutilando irremediavelmente aquele que é um edifício perfeito, uma obra magistral da arquitectura clássica.
Debruçando-me sobre a muralha pude vislumbrar com a imaginação o Teatro de Dionísio replecto de espectadores em túnicas brancas prontos para assistir à estreia de «As Bacantes» de Eurípedes. Tocar as colunas do Partenon podia ter sido o momento alto da minha visita a Atenas, mas não foi. Descendo a grandiosa escadaria do propileus virei à direita. Os meus olhos fixaram-se numa seta que dizia: Areópago. Aquele lugar era o mesmo onde o apóstolo Paulo discursou aos atenienses na sua segunda viagem missionária. Enquanto Evangélico Baptista tinha lido vezes sem conta aquele sermão em Actos dos Apóstolos 17:22-31. A minha mente tinha diversas vezes reconstruido aquele momento. E subitamente era eu que ali estava no mesmo lugar que Paulo de Tarso tinha pisado, com a enorme capital helénica a meus pés e os meus olhos perdidos junto às montanhas que a aconchegam como se fosse o miolo de uma ostra. As ruinas da Atenas clássica lá em baixo, o bairro Plaka à sua direita e então os meus olhos não puderam conter duas lágrimas que brotaram gêmeas e grávidas da emoção pela força simbólica daquele lugar.
Queria compartilhar a alegria de estar ali. Queria poder revelar a alguém o que sentia naquele preciso momento, mas não havia ninguém por perto que podesse compreender aquele meu estado patético de ficar com os olhos turvos de água por ter subido a um rochedo. Expliquei o significado histórico daquele espaço e do gozo que sentia por estar ali, mas soube a pouco. Quis ter ao lado alguém que se emocionasse também.
A emoção passou e guardei em mim o inesquecível momento de ter pisado terreno sagrado da civilização ocidental.

1 comentário:

Luís disse...

Num apressado InterRail de 30 dias, estive 3 deles em Atenas, logo depois de ter deixado Munique e antes ainda de seguir para Veneza. Mas foi já há perto de 25 anos. É um destino que nos atrai e ao qual espero regressar em breve. Parabéns pela tua escolha!