quarta-feira, agosto 01, 2007

N`«O MARINHEIRO» DE SANTA LUZIA

Já comentei várias vezes a tradição dos nossos jantares de Terça-feira. É precisamente o dia em que eu e o Shwasy saímos para jantar fora juntos. Em tempos idos era um jantar à luz da vela - percebem o que pretendo dizer - hoje é mais um jantar de família - também percebem o que quero significar? não? - eu explico: o pirralho de metro e setenta e cinco com apenas 13 anos faz-nos companhia desde há uns meses a esta parte. Não estou a reclamar. Se esquecer os hematomas nas canelas e os apertões no pescoço gosto muito que ele nos acompanhe. Dá um ar de normalidade à coisa; até as avós e as vizinhas passam por nós, cumprimentam e sorriem felizes como se consentissem pensando para si: que família feliz!

Hoje tivemos um desses jantares inesquecíveis. Temos por hábito ir descobrindo o que se serve à mesa dos restaurantes da região de Tavira. Quando gostamos repetimos. Quando nos foram indiferentes tentamos outro e quando nos estragam completamente a noite fazemos literalmente uma cruz à saída e não voltamos lá. Fica-nos a recordação da noite estragada que mais tarde servirá para nos divertirmos. Hoje fizemos três, sim, três cruzes, até o puto não exitou.

Este Verão viu nascer um novo restaurante na marginal de Santa Luzia, aquela vila que é chamada a capital do polvo, ali à beira da Ria Formosa a poente de Tavira. Abrir um restaurante naquele lugar é meio caminho andado para ser bem sucedido. Ali bem junto à famosa «Marisqueira Capelo» só não vence quem realmente não presta. Agora com a avenida toda aperaltada é um prazer jantar numa esplanada junto ao mar naquele ambiente de descontracção e descanso que os turistas nacionais lhe oferecem exibindo as suas bermudas floridas e os pólos azul bebé ou mesmo rosa Benfica, as cores da moda.

Acontece que por vezes as pessoas tornam difícil o que parece fácil. O novo restaurante é uma tentação visual, novo, bem arrumado, decorado com gosto, toalhas brancas sobre amarelo. Desde que abriu comecei a dizer ao Shwasy: «- temos que experimentar «O Marinheiro». Ele nunca mostrou grande interesse. Quase sempre vazio ou a meio gás, supus que se devia ao facto de ser novidade e onde a oferta é muita e de qualidade demorava a impor-se. Perante a minha insistência lá me explicou que quem explorava o restaurante «O marinheiro» era o responsável por um restaurante onde em tempos tínhamos sido servidos de dentes cerrados. Há um aglomerado de restaurantes em Tavira que se situam depois do Mercado Velho em direcção às Quatro Águas, ou à ponte nova, como preferirem que têm fama de não merecerem cada Euro que lá for gasto pela falta de qualidade culinária e de serviço. Pensei que o preconceito era excessivo e deixei de insistir. Mas amanhã é o primeiro dia de Agosto e desde o fim de semana que no Algarve não cabe mais ninguém, se me permitem o exagero, logo procurar restaurante, onde não se tenha que esperar por mesa, não é tarefa fácil.

O Shwasy deu meia volta ao carro, virou em direcção à marginal e disse vamos a«O marinheiro». Só me ocorreu defender-me afirmando que não tinha sido eu a ter a ideia. As 22 horas já não tardavam quando nos sentamos, na esplanada onde se podia sentir uma aragem finalmente fresca vinda do mar capaz de nos relaxar os sentidos. As mesas que nos foram indicadas não tinha sido usadas, mas já pouco restava do que tinha sido uma mesa preparada para servir jantares: uma tinha dois copos e a toalha branca de papel imaculada sobre um tecido amarelo que fazia um contraste gratificante. A outra já só tinha a toalha de papel marcada e suja pela base gelada uma garrafa de vinho ou de água. Sentamo-mos e aguardámos. Alguns minutos depois chegou o empregado com o tão português «couvert»: pão, manteiga, azeitonas. Eu como a minha toalha não estava própria já a tinha dobrado sobre o tampo da mesa esperando que a substituíssem. Para nosso espanto o profissional começava e pôr o serviço sobre a mesa sem se importar que a toalha estivesse dobrada. O Shwasy perante a minha atitude de pasmo disse ao empregado que a toalha estava suja e devia ser trocada. Escutamos a primeira de um rol insuportável de: «- peço desculpa!» Fizemos o pedido passados vários minutos. Os adereços de restauração eram de um chique despropositado contrastando com a desorientação do serviço que estava a ser prestado. As bebidas chegavam antes dos copos, as entradas antes dos talheres, oferecia-se vinho ao adolescente e coca-cola ao pai. Os guardanapos vieram em doses quase industriais, tanto de papel como de tecido depois de termos notado a sua ausência na mesa. Os copos ficavam vazios até que eu os voltasse a encher e o empregado pegava na garrafa de vinho e, num ritual aprendido à pressão com os colegas, preparava-se para repor o nível de vinho nos copos quando pediu desculpa pela milésima vez porque não se tinha apercebido que os copos estavam cheios num embaraço anedótico. A esta altura já eu tinha pena do empregado de mesa à força que nos tinha calhado. Devia ser muito desconfortável não perceber nada do que estava a fazer. As ameijoas do Flávio eram um mar de gordura, as nossas sopas de peixe tinha um leve gosto a caril e alho e sem pitada de sal! Sem comentários! Não encontro palavras para a descrever. Os pratos principais foram servidos depois sem demora, mas não sem parte do molho da carne me ter ficado a escorrer pelo braço esquerdo e «medalhado» abundantemente as jeans que tinha vestidos. E não foi o mesmo funcionário! Só o Flávio depois de muito exitar comeu a maior parte do turnedó que o pai lhe sugeriu. O bife à Marinheiro do Shwasy estava sofrível e o meu intragável. trazer à mesa um bife que tinha sido literalmente espancado antes de ser cozinhado para disfarçar a sua rigidez já é de mau gosto, mas temperá-lo à base de alho, mais uma vez, o que devia ser um «Bife ao Madeira» é demais. A mistura dos dois sabores era perfeitamente imprópria e resultava num sabor que ao paladar se tornava quase repulsivo. Ficou no prato. Quando o empregado, que antes nos tinha confessado que o serviço estava um pouco atrapalhado, quando nós já tínhamos comentado que ele tinha um nó que o atava da cabeça aos pés e não fazia a mínima ideia do que estava ali a fazer, veio levantar o prato e perguntou se não tinha gostado só me ocorreu dizer que o cozinheiro devia repensar aquele prato. Fui meigo. O que devia ter saído da minha boca era: «Diga ao gerente que se quer evitar a falência do restaurante deve substituir rapidamente as mesas da esplanada que são desconfortáveis e estão inclinadas para a direita, os empregados de mesa que não sabem o que estão a fazer e o cozinheiro que não sabe confeccionar um bife com batas fritas e ovo a cavalo!»

Imaginando o que mais poderia ter acontecido se tivéssemos pedido sobremesa e cafés pedimos a conta. Não demorou nada a que o roubo com consentimento fosse consumado com sorrisos e tudo. Faltaram poucos cêntimos para que uma nota de 100 euros não pagasse a conta, a troco de um serviço miserável e de três refeições que se tivessem sido pizzas congeladas do Lidl teriam sabido melhor. Nem um cêntimo de gratificação ficou de recordação, todo o vinho que sobrou encheu os copos. O artista que nos serviu ainda teve coragem de nos agradecer e desejar boa-noite ao que recebeu em troca apenas um boa-noite.

Ainda vamos rir muito quando nos lembrarmos deste jantar!

2 comentários:

João Baptista disse...

é esse Allgarve que me custa a engolir, e é pena...

Anónimo disse...

Desculpe, mas parece-me que está a exagerar... Os cavalheiros do restaurante quiseram (sim) dar-lhe o mote para uma interessante prosa... Francamente, para não ficar com problemas de consciência, devia (sim) retirar o dito cujo do rol de «resturantes a abater»...

(Nem as ameijoas se safaram...)