segunda-feira, abril 16, 2007

A MINHA ALDEIA





Casa onde Florbela Espanca viveu em Quelfes


Dei voltas e voltas e acabei por vir morar na aldeia mais pequena do conselho de Olhão. Curiosamente foi na terra onde meu pai fez a escola primária até à terceira classe, altura em que o pai lhe deu um cajado e fez dele pastor de ovelhas, que vim assentar arraiais. Foi apenas uma coincidência, nada deliberado. Foi aqui ao lado da escola, onde o meu irmão mais velho ainda fez a primeira classe, que encontrei a casa que me encheu as medidas e a bom preço. Sendo um «montanheiro» não gosto da cidade. Viver num apartamento fechado num 5º andar nunca me passou pela cabeça, para experiência bastou-me o tempo vivido em Queluz e em Beja, num 5º e num 7º andar.
A aldeola é minúscula. Não fosse esta urbanização pouco mais seria que um amontoado de casas à volta de uma igreja desmesurada para o tamanho da terreola. A maior referência cultural de Quelfes deve-se ao facto da grande poetisa Florbela Espanca aqui ter passado algum tempo da sua vida, para curar os males do corpo porque os da alma e do coração nunca conseguiu. Há ainda uma referência histórica associada às invasões francesas cujas tropas foram derrotadas ali junto à ponte romana de Brancanes, sobre a ribeira de Marim, por onde meu pai encaminhou as suas ovelhas vezes sem conta. As tropas de Napoleão ficaram com más recordações do local onde muitos séculos antes outros invasores decidiram construir uma ponte pequenina, mas firme como o céu, de tal forma que ainda hoje lá está para quem a quizer atravessar.
Da minha aldeia não se vê o mar. Nem sei como pude abdicar desse luxo. É mesmo um luxo ter casa com vista para o mar, hoje em dia, no Algarve. Eu que sempre usufrui desse luxo, esqueci-me dele ao comprar casa. Às vezes dou comigo a pensar na falta que me faz ir à janela ou ao terraço e ter o infinito azul pela frente. Felizmente o mar é logo ali abaixo e quando desço a estrada sou compensado por uma deslumbrante visão da Ria Formosa na maré cheia com a Ilha da Armona, redonda e branca de areia quente na minha frente e o despontar do farol no cabo de Santa Maria lá mais ao fundo. Não gosto de sentir o mar longe de mais. Ficar longe do mar é ficar privado de infinito que o azul do céu não substitui.
A minha aldeia foi feita à minha medida, perto do essencial, que prezo, e longe da confusão que não foi feita para mim. Aqui onde meu pai foi pastor dou comigo a pastorear os meus sonhos e a inspirar uma vida, que quando era pequeno nunca pensei vir a ter.

3 comentários:

Oz disse...

Que maravilha teres encontrado um lugar à tua medida. Nem todos podemos dizer o mesmo.

João Baptista disse...

Não conheço, é um dos meus planos para uma proxima ida ao Algarve

LusoBoy disse...

Muito gira a tua aldeia :).