
Há um fosso enorme entre a política que se faz em Portugal, e aquela que se faz nas democracias socialmente avançadas da Europa central e do norte, mas desde há algum tempo também, pelos nossos vizinhos espanhóis. É um fosso de princípios políticos na maneira de governar para o povo e com o povo.
A democracia foi definida, em tempos, como a ditadura da maioria. É uma verdade que quem tem a maioria governa, decide, executa ainda que uma minoria discorde. Não há outra forma de a tornar funcional. Em democracia os consensos são desejáveis mas não essenciais. Os governos suportados pela maioria dos deputados governam de acordo com o programa eleitoral que lhes deu essa maioria.
Em Portugal existe a visão que todas as leis e medidas que se aprovam devem ter a concordância da maioria dos eleitores quer essa medida interesse a todos ou só a minorias definidas que na sua esmagadora maioria são favoráveis à sua aprovação. Mas como a maioria do povo, por falta de formação, de interesse ou por reserva mental por razões religiosas ou morais, não é favorável à aprovação de tal medida ela fica adiada nas gavetas dos gabinetes ministeriais, esquecida, insensível aos desejos das minorias que seriam dignificadas com a sua aprovação sem que por isso viesse mal à maioria insensível ou contrária à sua aprovação.
Razões religiosas sobretudo são o factor de bloqueio da sociedade portuguesa na aprovação de leis defendidas pelas minorias. A sociedade portuguesa nos inquéritos diz-se católica, mas na prática nós sabemos quantos são os católicos portugueses e salvo uma minoria, que respeito, sei qual a sua moral e ética pessoal no que diz respeito ao casamento, ao divórcio, ao aborto, à adopção, aos casamentos homossexuais, à procriação medicamente assistida, etc. E sabemos também quais as práticas quando se fala de fidelidade matrimonial, sexo pré matrimonial, uso do preservativo e outros anticoncepcionais. Um país onde o recurso aos serviços sexuais pagos é uma instituição, a instituição familiar tradicional não passa muitas vezes de uma fachada. Os portugueses têm tectos de vidro, mas adoram atirar pedras ao do vizinho! É uma hipocrisia total, um cinismo atróz, mas quando se trata de permitir que uma lei liberalize os costumes, levanta-se uma onda de véu e rosário virada para Fátima que teme o fogo do Inferno por permitir que os outros sejam livres de «pecar». Em Portugal decide-se pela maioria quer o assunto lhe diga respeito ou não.
Nos países do Norte da Europa e na nossa vizinha Espanha o poder político decide no particular pelo interesse da maioria que compõe a minoria a quem interessa a lei. É assim que se aprovam leis que regulam a prostituição, uma profissão que terá sempre muitos profissionais activos; nunca nenhum governo conseguiu eliminá-la: a solução é regulamenta-la e não ignorá-la como por cá se faz. A lei da procriação medicamente assistida foi em muitos países alargada a quem dela necessitar para ter um filho, em Portugal restringe-se aos casais inférteis, casados ou em união de facto. A união civil de homossexuais que só a eles interessa foi aprovada em vários países, em Portugal continua na gaveta sob o pretexto que o país tem problemas mais graves por resolver, como se resolver este retardasse a solução dos outros. Falta é coragem de enfrentar a Igreja Católica.Noutros países a adopção de crianças foi alargada a casais gays, em Portugal nem pensar; os gays portugueses comem criancinhas!
O que impede Portugal de se aproximar da realidade dos seus vizinhos europeus mais inovadores é sobretudo uma atitude hipocrito-católica da sociedade portuguesa e a falta de ousadia de quem nos governa que cobardemente se refugia atrás do conservadorismo religioso de um povo que não tem problema de recorrer a prostitutas para satisfazer as suas fantasias sexuais, de abortar clandestinamente para evitar o filho não desejado, tomar a pílula para ter relações sexuais antes do casamento, ou o preservativo fora dele, que é capaz de usar de violência sobre os seus filhos, que acaba com o casamento como todos os outros sem preconceitos, mas não tem a frontalidade de legalizar esses comportamentos.
Somos governados como um rebanho de ovelhas pachorrentas, porque assim queremos, quando somos animais racionais com desejos, ambições e necessidades diferentes uns dos outros.
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